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07 JUL 2015

No Brasil, jornalista James Bamford discute privacidade em tempos de NSA


IDG Now! - 03/07/2015 - [gif]


Autor: Carla Matsu
Assunto: Evento

Escritor de quatro livros sobre a agência americana, Bamford elenca alguns dos métodos que a agência usa para monitorar americanos e nações do mundo todo

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Durante palestra em São Paulo a convite do Comitê Gestor da Internet, o jornalista e escritor James Bamford, 65, dá amostras de que sim, há razões para você viver paranoico. 

Em tempos onde facilmente concordamos em entregar nossos dados a grandes corporações em troca de entretenimento e comunicação em redes sociais, aplicativos e afins, o escritor não é muito otimista quando o assunto é privacidade. E Bamford, talvez como ninguém, sabe que esse cenário não é exclusivo de nossa contemporaneidade.

Em 1982, o escritor e editor especial da revista Wired causou dor de cabeça à Agência de Segurança Nacional americana. A data se refere ao ano de publicação de seu primeiro livro investigativo sobre a instituição. 

Em “The Puzzle Palace”, Bamford descreve a agência como “livre de restrições legais e com capacidades tecnológicas para espionagem além da imaginação”. E prevê: “Como um buraco cada vez maior, a tecnologia de vigilância da NSA vai continuar a expandir-se silenciosamente atraindo mais e mais comunicações e, gradualmente, eliminando mais e mais privacidade”.

Bamford é um aficionado pelo tema. Não à toa se dedicou a escrever mais três livros sobre. O último deles foi publicado em 2008, o “The Shadow Factory: The Ultra-Secret N.S.A. from 9/11 to the Eavesdropping on America”. Em tradução livre: “A Fábrica da Sombra: A Ultra-Secreta N.S.A. de 11/09 a espionagem sobre a América”. Em entrevista ao The New Yorker, publicada em junho de 2013, Bamford fala que tem uma relação de amor e ódio com a agência: “Eu os amo e eles me odeiam”.

Bamford sabe na ponta da língua toda a trajetória da agência de espionagem americana e fala rápido sobre o assunto, talvez na tentativa de comprimir ao máximo, em pouco menos de uma hora, tudo que sabe sobre o órgão iniciado em 1952 pelo então presidente Harry Truman.

James é didático ao explicar qual é a vocação da agência que chamou a atenção da mídia internacional quando Edward Snowden veio a público com provas dos programas de vigilância que os Estados Unidos usava para espionar não somente a população americana como vários países da Europa e América Latina, incluindo o Brasil. Por meio dos documentos vazados, soube-se que a NSA monitorava conversas da presidente Dilma Rousseff som seus principais assessores. “Eles [NSA] espionam não só países considerados inimigos, mas também aqueles com quem mantém relações diplomáticas”, destaca Bamford durante palestra.

Snowden não foi o primeiro delator da agência, o título ficaria para Perry Fellwock, ex-analista da NSA que ficou conhecido pela imprensa sob o pseudônimo de Winslow Peck – isso há cerca de 40 anos.

No entanto, Snowden talvez tenha ganhado a maior repercussão sobre o caso. Indagado sobre o porquê de tantos holofotes sobre ele, Bamford resume: “ele mostrou provas”.

“Eu o entrevistei no ano passado e ele me disse que com a experiência dos outros delatores, que sempre eram abafados pelo governo e supostamente desmentidos pela própria NSA por só darem depoimentos verbais, que ele precisaria fazer diferente. Por isso reuniu provas e as publicou sequencialmente”, lembra.

Onipresença

Bamford destaca a vocação onipresente a qual a NSA tem se dedicado de forma persistente. De forma geral, o jornalista lembra as tecnologias que a agência americana detém para rastrear dados e informações transmitidos via satélites, cabos subterrâneos e fibra óptica.

Se em 1982, com o primeiro livro sobre o tema, Bamford previa que a NSA não pouparia custos para evoluir em tecnologia de vigilância – segundo o escritor, a instituição conta com um orçamento anual de 10.2 bilhões – hoje a NSA avança em sua onipresença rumo a Internet.

Graças aos documentos revelados por Snowden, soube-se que a agência tem acesso aos servidores de grandes empresas de tecnologia, como Google, Apple e Microsoft, abrangendo uma grande área de dados de usuários da Internet. 

No início deste ano, outro documento apontava que a NSA havia usado lojas de aplicativos do Google e Samsung supostamente com o objetivo de instalar malwares em aparelhos. Ao plantar softwares maliciosos, a agência poderia coletar secretamente dados de milhões de usuários pelo mundo. Os relatórios ainda apontavam uma série de oficinas realizadas pela NSA e países "parceiros", caso de Canadá, Reino Unido, Nova Zelândia e Austrália - conhecidos como o grupo "Five Eyes".

Um dos programas de vigilância da NSA, batizado de Turbine, segundo Bamford, teria capacidade de desenvolver ferramentas de hacking de força industrial, com a capacidade de instalar malwares em computadores em todo o mundo.

Big Data da vigilância

Para um volume de dados sem precedentes coletados durante anos, a NSA conta com poderosos data centers instalados no deserto de Utah, Estados Unidos.

"Todas essas informações, vindas de todos os lugares, quando chegam aos Estados Unidos vão para lá", diz Bamford apontando para um de seus slides.

O jornalista fala sobre um dos projetos de outra agência americana, a IARPA (Intelligence Advanced Research Projects Activity), que visa o desenvolvimento de um supercomputador de um exaflop. "Para se ter uma ideia de sua potência, este computador precisará de um sistema de resfriamento que seria suficiente para resfriar o equivalente as duas torres gêmeas", diz o escritor. 

A ideia é que o supercomputador possa processar o enorme volume de big data, decriptamento de mensagens e arquivos.

"A ideia é que temos esse monte de feno", compara Bamford sobre o volume de dados coletados. "Acho que a NSA perdeu a primeira informação sobre o ataque ao World Trade Center, ao ataque das embaixadas na África e até mesmo a bomba implantada na maratona de Boston. Então para que eles estão fazendo esses investimentos se não conseguiram prevenir esses ataques?", questiona.

Segundo a NSA, tais programas de segurança nacional têm como objetivo prevenir ataques terroristas.  "Na verdade, um caso só foi interrompido", diz Bamford.

Para o jornalista, a saída para tentar assegurar a privacidade - tanto na esfera pública quanto privada - requer investimentos na área de pesquisa e desenvolvimento de criptografia, envolvendo aí o desenvolvimento não só de tecnologias, mas também expertise humana.

Nesse cenário, Bamford reconhece os esforços do Brasil. O escritor chama atenção para o iminente lançamento do satélite brasileiro Embratel Star One C-4,

"A ideia é que o satélite mostra que o Brasil aprendeu com o NSA. É algo que o País possa se orgulhar". Segundo Bamford, o uso de empresas brasileiras para o desenvolvimento de satélites e tecnologia de transmissão de dados, excluindo a necessidade de material importado dos Estados Unidos, barra as chances de monitoramento da agência.

"O Brasil tem se mostrado muito inovador e pró-ativo nessa área. Acredito que precisamos ter mais foco em desenvolver mecanismos de defesa, mais criptografia de dados. Pois nosso conhecimento, de forma geral, é muito limitado. Então aqueles países que estão desenvolvendo tais mecanismos certamente sairão na frente”, conclui.