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09 AGO 2000

Brasil com um pé no ICANN






Arquivo do Clipping 2000

Veículo: TCInet
Data: 09/08/2000
Assunto: Internet

Ivan Moura Campos é o favorito ao posto na AL

Fabrícia Peixoto, do TCInet

"Brasil não pode ser apenas comprador"

Sorridente e bem-humorado, Ivan Moura Campos é o verdadeiro candidato. O representante do Comitê Gestor de Internet no Brasil concorre ao posto de presidente regional do ICANN (Internet Corporation for Assigned Names and Numbers), órgão com poder para coordenar e atribuir nomes de domínios na Internet mundial, entre outras responsabilidades.

A idéia de concorrer ao posto internacional partiu dos amigos. "Eles achavam que eu era bastante conhecido, que seria fácil conseguir a adesão dos internautas". Os amigos tinham razão: do total de filiados ao ICANN, 80% são brasileiros.

Aos 56 anos, Ivan tem um currículo extenso. Durante quatro anos estudou na Universidade da Califórnia, onde concluiu o PhD em Ciência e Tecnologia. Nessa época conheceu grandes figuras da Internet, como Vincent Cerf, considerado um dos criadores da grande rede.

Voltou para o Brasil em 77, dessa vez como pró-reitor de Pós-graduação da UFMG. Como ex-secretário de política de Informática e automação do Ministério da Ciência e Tecnologia, Ivan Moura conhece de perto as deficiências do mercado brasileiro.

O professor da UFMG não mede palavras; elogia o que há de bom no Brasil com a mesma desenvoltura que critica as falhas do governo. Segundo ele, somente com a união da América Latina os países da região poderão sobreviver à guerra tecnológica.


TCINet - Dos 6.336 afiliados ao ICANN na América Latina e Caribe, 80% são do Brasil. Isso significa que a eleição está ganha?
Ivan Moura - (Risos). Muita gente, em vez de perguntar "você vai votar no ICANN?", pergunta "você vai votar no Ivan?". Ao mesmo tempo em que fico feliz, sinto uma certa preocupação. Não quero ser visto como o representante do Brasil. Para que minhas idéias sejam implementadas, preciso da legitimidade de toda a América Latina. É bom lembrar que existem mais dois concorrentes indicados pelo board do ICANN: Raul Rchetberria (Uruguai) e Patricio Poblete (Chile)

TCInet - Mas se o senhor chegar lá, quais serão as prioridades?
Ivan Moura - A prioridade é a questão do domínio. Estamos desenvolvendo tecnologias para ampliar as possibilidades de endereço na Web, principalmente com o Protocolo Versão 6 (PV6). Além disso, não temos nenhum servidor-raiz abaixo da Linha do Equador, o que é um absurdo.

TCInet - E quanto à expansão da Internet? Ainda existem nichos a serem explorados?
Ivan Moura - Costumo comparar a expansão da Web com a corrida pelo ouro nos Estados Unidos. Na época, poucos saíram de lá milionários, a grande maioria não achou nada... Sabe quem enriqueceu de verdade? Quem vendia dinamites, pás e carrinhos. Precisamos encontrar as pás da Internet, ou seja, novos caminhos... Mas que eles existem, existem.

TCInet - O Brasil pode ser considerado uma potência no mercado de Internet?
Ivan Moura Campos - Sou um otimista de carteirinha, mas não podemos ser ingênuos. Quando falamos em Internet, o Brasil está realmente entre as grandes potências, sendo o principal mercado da América Latina. Mas a Web não é tudo, é apenas um dos serviços proporcionados pela nova economia.

Agora, quando o assunto é tecnologia, o Brasil continua sendo visto pela comunidade mundial como um grande comprador. Não vejo mal algum nisso, realmente temos um grande mercado consumidor. Mas não podemos ser apenas compradores, é preciso que a balança esteja equilibrada. Temos potencial para fabricar marcas próprias, basta que haja uma interação entre empresários e o mundo acadêmico.

TCInet - A saída é investir mais em pesquisa? 
Ivan Moura - É inegável que muita coisa se produz dentro das universidades e grande parte não é aproveitada. Mas é preciso ser racional: os recursos destinados a pesquisa são escassos. Não podemos nos dar ao luxo de financiar qualquer idéia. Costumo dizer que os projetos devem ser realizados no estilo "Pasteur": pesquisa de base sim, mas sempre de olho em um objetivo prático.

A indústria, quando chega à academia, costuma pedir soluções para ontem e não é bem assim. Ao mesmo tempo, as universidades não podem ficar alimentando projetos ad infinitum. Os dois lados precisam se entender. 

TCInet - A nova Lei de Informática, que será analisada em breve pelo Senado, está de acordo com a realidade brasileira?
Ivan Moura - Essa coisa de continuar beneficiando a Zona Franca de Manaus é extremamente prejudicial ao desenvolvimento tecnológico do país. Não tenho nada contra a região, mas é ingenuidade afirmar que a cidade é um pólo industrial. Os benefícios fiscais atraem os grandes fabricantes, inibindo o crescimento da indústria brasileira. Em pouco tempo, a TV digital vai despontar no país e eu pergunto: temos algum aparelho totalmente fabricado no Brasil? Não é tão difícil assim montar uma televisão... temos tecnologia para isso. Basta que o mercado seja mais justo. Podíamos ter, pelo menos, uma marca latino-americana.

TCInet - O senhor fala sempre na união dos países da América Latina. Mas Brasil e Argentina, as duas grandes potências da região, vivem em brigas... 
Ivan Moura - Costumo dizer que essas rixas não passam de brigas caseiras. É algo natural entre nações vizinhas que detêm certo poder econômico. As discussões em torno de taxas de importação ou proteção ao mercado interno são pequenas diante do que toda a região tem a ganhar com a união.